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segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Na contra-mão da tecnologia

Desde a semana passada estou como se tivesse cometido um pecado inominável e imperdoável. Um incômodo sugerindo constantemente um conserto, uma retratação. Estou na quase condição de uma herege, ou de alguém que tivesse cometido alguma falta que reclamasse a condição de pessoa civilizada, talvez como tendo caído no décimo e algum mandamento. E, veja só, Isso tudo porque excluí meu perfil do Orkut.
Sinto-me como se tivesse optado pela idade da pedra lascada tecnológica ou coisa semelhante, afinal, pus-me no vértice do mundo em um tempo em que participar de coisas semelhantes é condição para sentir-se viva. Optar por tamanha insanidade em pleno século XXI é como escolher o trotar lânguido de uma mula à celeridade de uma veloz Ferrari.
Mas, se vale uma explicação, ei-la: fiz isso porque cansei de receber scraps adocicados e gentis enviados por pessoas que passam por mim e mal me dirigem a palavra. (O que fizeram com a velha e saudosa franqueza pessoal? Ou com o aconchegante e empático olhar?) Também porque cansei de diariamente precisar olhar minha página por temer que alguém se achasse diminuído por não ter me lembrado de seu aniversário, afinal há dias um aviso estava diante de meus olhos. (Quanta insensibilidade!) E ainda por me sentir na obrigação de responder a todos aqueles que nem sabem como estou, mas, numa espécie de mala-direta cega, distribuem declarações de amizade eterna e fidelidade.
Pode ser que eu me coloque na contramão das tendências atuais entre tantos facebooks, twitters e orkuts que conceituam nossa época. Talvez me caiba bem a definição, contudo,na minha opinião, há certas mudanças que não deviam ser vistas como evolução em termos de convívio social ou relacionamento. Não sinto falta de palavras ternas de quem não se importa comigo e que até há pouco nem lembrava que eu existia. E você pode dizer que estou sendo ingrata ou que nem todos poderiam ser enquadrados dessa forma. É verdade. Não posso ser injusta a tal ponto. Contudo, todos sabem que essa é a regra. Portanto, entendo que não podemos querer substituir a essência de nossos relacionamentos por virtualidades circunstanciais.
Prefiro o abraço apertado, o telefonema saudoso, ou até mesmo um e-mail dedicado de quem nem sempre pode me ver, porque posso me sentir como individualmente lembrada e amada. E se a isso dão o nome de antipopularidade, que seja. O tempo e a idade me ensinaram a não me importar se não consigo, dessa maneira, superar o número de contatos que fariam de mim uma pessoa de invejável perfil.
Tenho a impressão que ainda vou sentir algum tempo como se tivesse cometido algo brutalmente incorrigível. É incrível o que fazem conosco em termos de ditames do que é aceitável e exigível, do que nos torna alguém bem relacionado. Contudo, antes ser tachada de retrógrada a aceitar como prova de bem-querer tantos contatos de quem sequer conheço por um simples e inócuo status. Creia-me, dá para viver sem.


quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Esperança*

Acho que hoje descobri o que é esperança: é aquela pontinha de alguma coisa que teima em continuar existindo, mesmo quando você tem mais do que motivos para não acreditar mais. Você pode até chamar de ilusão ou de ingenuidade, mas quero me agarrar a esse fiozinho de expectativa boa – nem sabia que tinha mais – que ainda há dentro de mim, posso? Tudo isso porque ouvi no discurso de nossa recente empossada presidenta da República que os professores devem ser vistos como a autoridade na sala de aula, numa leve alusão que precisamos ser mais respeitados.
Não me prendo ao termo autoridade em si. Não é isso que realmente interessa, mas é que talvez você não tenha ideia de como é se sentir há décadas como o principal (ou seria o único?) culpado pelo descalabro generalizado que há na educação. Se o aluno não é aprovado; se não aprende; se não frequenta as aulas; se desiste antes de terminar o ano; se não consegue discernir o que lê... enfim, tudo é culpa daquele que sai de casa todos os dias só pensando em fazer nada quando chega em sala de aula (segundo o que pensam), e senta-se atrás de um confortável birô, na frente de um quadro multimídia, em uma sala de acústica perfeita, olhando o relógio a cada cinco minutos, enquanto uma turma superinteressada impacienta-se ao não aprender nada naquele dia.
Talvez o Brasil esteja chegando ao ponto de discutir essa relação de forma mais madura. Talvez esteja pronto para parar de procurar culpados e encontrar o lugar que cada pessoa ocupa nessa triste realidade educacional
Não se faz educação só em sala de aula, tampouco apenas com o professor. A sociedade precisa entender que nesse processo há participação plena de todos: desde os exemplos dados pelas autoridades à relação que acontece na família de cada um. Será que é isso que está sendo apontado por nossa líder?
Aquece-me o ânimo pensar que alguma coisa ainda possa acontecer. Mais do que aumento de índices para inglês ver (ou seria búlgaro?), exulto em ainda ter a possibilidade de ver a educação sendo levada a sério.
Não seria a primeira vez que esse tipo de coisa acontece comigo. De vez em quando me vejo querendo crer em algumas coisas atípicas da nossa realidade (loucura ou utopia?), mas o simples fato de ter descoberto isso em mim me fez bem. Pelo menos me fez perceber que ainda creio em milagres.




Ana Valéria Moraes

Texto publicado no Jornal O Povo
em 20 de agosto de 2011
http://www.opovo.com.br/app/opovo/jornaldoleitor/2011/08/20/noticiajornaldoleitorjornal,2280954/esperanca.shtml
em 02 de abril de 2011
http://www.opovo.com.br/app/opovo/jornaldoleitor/2011/04/02/noticiajornaldoleitorjornal,2119204/esperanca.shtml